Suely Caldas, O Estado de S.Paulo
No dia em que o campo gigante de Libra foi vendido para a Petrobrás e quatro empresas estrangeiras, a presidente Dilma Rousseff foi à TV comemorar o sucesso do leilão e garantir que seu governo não privatizou o petróleo do pré-sal.
Ora, então por que leiloou? Por que despachou equipes para a Europa, EUA e China com a missão de "vender" o petróleo do pré-sal como um bom negócio? Por que a tristeza e a decepção de seu governo quando as gigantes Chevron, British Petroleum e Exxon Mobil desistiram da licitação?
Por que a alegria e o alívio quando a francesa Total e a anglo-holandesa Shell aderiram ao consórcio vencedor? Por que negar algo tão simples e óbvio?
A resposta veio de um ex-tucano (hoje aliado querido de Dilma), o prefeito do Rio de Janeiro, Eduardo Paes: "O discurso antiprivatista ainda resiste no Brasil de 2013, quando a gente vê pessoas fazendo questão de dizer que não estão privatizando ou negociando com o setor privado", afirmou ele na manhã seguinte ao discurso da aliada, misturando espanto, lamento e decepção.
Afinal, em mais de 20 anos a privatização já deu provas e provas de que mais enriquece a população do que empobrece o patrimônio público. Privatização e autonomia do Banco Central nasceram liberais e tornaram-se políticas universais.
Mas com espantosa insistência ela ainda é atacada, por oportunismo político de quem usa o argumento do falso nacionalismo para impressionar e comover os brios do sincero patriotismo dos brasileiros. Pura enganação.
O que os políticos defendem são seus interesses e privilégios, temem o desmanche de uma parcela do Estado que sempre usaram para trocar favores, comprar aliados, fazer caixa para suas campanhas eleitorais. Só alguns exemplos: os bancos estaduais, as elétricas estaduais, as siderúrgicas federais, a Rede Ferroviária Federal (a Valec pode seguir caminho igual) e muitas outras. Felizmente privatizadas.
A Vale privada ganhou em qualidade de gestão e passou a arrecadar para o Estado mais dinheiro em impostos do que em dividendos quando era estatal.
Não parece o caso da presidente Dilma. O combustível que a move é ideológico, mas de uma forma tão confusa e atrapalhada - porque contraditória (afinal, ela precisa do capital privado) - que mais tem prejudicado sua gestão do que satisfeito seu preconceito.
No leilão de Libra a presença de petroleiros nas ruas denunciando-a por ter "traído" o compromisso de não privatizar o pré-sal levou Dilma a recuar aos anos 70 e ignorar que aqueles ideais desmoronaram junto com o Muro de Berlim, e foi à telinha da TV responder, negar a "traição" e a privatização que seu governo acabara de fazer.
Seu argumento: não seria privatização porque 85% da renda de Libra irá para a Petrobrás e a União. Principal idealizadora do modelo de exploração do pré-sal, logo após o leilão Dilma repetiu duas vezes que não vai alterar nada, mesmo com Libra - o filé do filé do pré-sal - tendo atraído um único consórcio e vendido a maior reserva de petróleo do mundo pelo preço mínimo, sem nenhuma disputa.
Para garantir 85% da renda para o Estado não precisaria criar mais gasto público com uma nova estatal (a PPSA, que vai administrar o pré-sal) nem sacrificar a Petrobrás com a obrigatoriedade de bancar 30% de todos os poços, tampouco afastar o investidor desconfiado com frequentes interferências políticas do governo em estatais.
Para isso bastaria elevar taxas e impostos para valores equivalentes, manter o regime de partilha, mas tirar da Petrobrás o peso maior pelos investimentos. O efeito de gerar riqueza para aplicar na área social seria o mesmo.
Dilma precisa do capital privado para seu programa de investimentos em portos, aeroportos, ferrovias, rodovias, energia e petróleo. Se hoje a crise de confiança entre seu governo e empresários tem causado graves prejuízos e inibido investimentos, o que esperar de um discurso escancaradamente anti-privatista da própria presidente, levado a público em rede nacional de TV?
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segunda-feira, 28 de outubro de 2013
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