Por Edson Joel Hirano Kamakura de Souza
Brasil de 1904. A capital do país era o Rio de Janeiro, a maior cidade brasileira com 720 mil habitantes, então. O presidente Rodrigues Alves chama Oswaldo Cruz para assumir Diretoria Geral de Saúde, o grande problema nacional. O povo morria de febre amarela e varíola durante epidemias que grassavam por todos os cantos. A ignorância era outro grande mal do país que acabara de inaugurar a república.
Com tantas mortes o cientista e sanitarista Oswaldo Cruz lançou uma campanha contra o mosquito transmissor da doença com brigadas de mata mosca, limpando esgotos, ruas, terrenos e caixas d'água. A equipe usava força bruta para entrar nas casas e remover doentes compulsoriamente para os hospitais ou isolados.
O povo se irritou diante do "autoritarismo" das campanhas e se revoltou quando a vacinação contra a varíola tornou-se obrigatória. No dia 31 de outubro de 1904 a lei foi aprovada pelo Congresso e no dia 4 de novembro daquele ano irrompeu-se o que passou a ser chamada de Revolta da Vacina com graves confrontos entre populares e forças policiais. Dia 14 de novembro os Cadetes da Escola Militar também se rebelaram. Contidos os movimentos contra a vacinação, Oswaldo Cruz voltou ao comando.
- O bem coletivo poderia se sobrepor á liberdade individual? - perguntava a oposição política.
- O bem coletivo poderia se sobrepor à ignorância individual - respondiam os favoráveis a campanha.
A revolta não ocorreu apenas nas ruas mas, nas tribunas e imprensa. Rui Barbosa, o grande tribuno da Haia e então senador da república e contra a vacinação, usando de terror ao chamar a campanha de tirana e violenta, despachou, irresponsavelmente:
"A lei da vacina obrigatória é uma lei morta. .... Assim como o direito veda ao poder humano invadir-nos a consciência, assim lhe veda transpor-nos a epiderme. ..... Logo não tem nome, na categoria dos crimes do poder, a temeridade, a violência, a tirania, a que ele se aventura, expondo-se, voluntariamente, obstinadamente, a me envenenar, com a introdução, no meu sangue, de um vírus, em cuja influência existem os mais fundados receios de que seja um condutor da moléstia, ou da morte."
O povo destruiu a pavimentação de pedras, tombou bondes, quebrou lampiões e arrancou trilhos transformando as ruas do Rio de Janeiro em cenário de desolação. Canhões da marinha e soldados do exército atiraram contra o povo: 30 mortos, 110 feridos e quase mil presos. Os tumultos duraram até 16 de novembro. Muito mais tarde Rui Barbosa reconheceu o erro. A ciência venceu.