Depois de muitos anos, encontrei um amigo das antigas. Rodando de carro, pra mostrar a cidade, rolou papo de todo tipo. Mas a conversa foi bem até passarmos por uma loja do McDonald's. Então meu amigo começou a se lamuriar.
- Tenho ódio quando entro aqui porque passo apertado com meus netos - disse ele, referindo-se a canalhice da venda casada de brinquedos e lanches, que dobram os preços.
Não apenas no Mc Donald's mas dezenas de produtos estampam super heróis em ovos de páscoa e alimentos para crianças. O apelo fomenta as vendas e a comilança, mesmo sem fome. Segundo o IBGE, 15% das crianças brasileiras, entre 5 e 9 anos, estão gordinhas. Isso é argumento mais que suficiente para que os "defensores dos fracos e oprimidos" levantem bandeiras pedindo a proibição dessa prática comercial, realmente nada saudável para crianças... e para a carteira dos pais.
- Será que não tem algum deputado para propor a proibição desse tipo de comércio? - esbravejou ele.
- Esse é o problema - respondi. Os pais, sem autoridade sobre seus filhos, esperam que o Estado crie leis e solucione por eles um problema que eles deveriam resolver - ataquei sem me preocupar em ferir suscetibilidades. Curioso, tenho 4 netos com a mesma idade dos seus e nunca tive problemas com isso - respondi ao seu argumento.
- Como assim? - perguntou, meio incrédulo, desejando descobrir a mágica de como ir ao Mc Donald's sem a preocupação de assistir a um festival de crianças birrentas querendo os ridículos e caros brinquedos. Então, calmamente, expliquei:
- Faz muito tempo, quando eram muitos menores ainda, tive uma conversa séria e rápida com eles. Antes de sairmos para a hamburgueria perguntei-lhes se iriamos comer lanches ou comprar brinquedinhos. E fiz uma proposta: quem quisesse brinquedos ficaria sentado esperando que os outros comessem. E só depois sairíamos pra comprar algum brinquedo estúpido em alguma lojinha de 1,99. Todos escolheram seus lanches preferidos... sem brinquedos. E assim foi ao longo dos anos.
Contei-lhe que um dos netos, então com 5 anos, tinha elaborado uma "pesquisa de preços" onde comparava que o valor de 200 gramas de um bom chocolate triplicava na forma de ovo de páscoa. "Vô, isso é um absurdo!", disse-me o menino. Ou a recusa de um deles em pagar R$ 20 por duas bolas de sorvetes servidas num festival de Food Truck. Penso que aprenderam a lição.
- Eu não aceito que o Estado controle o que meus filhos e netos devam comer na escola ou no McDonald's. Eu não aceito que o Estado diga o que meus filhos e netos devam ler, que programas devam assistir na tv ou se devo ou não dar palmadinhas na bundinha deles. Os pais é que devem educar seus filhos, criar consciência crítica neles e não ficar esperando que o Estado resolva. É preciso lei para que idosos ou gestantes avancem na fila ou bastaria educação?
Penso que, na verdade, os pais perderam o controle sobre seus filhos e se desmancham em terapias pra aprender dizer um simples não a uma criança mimada. Depois, para não se sentirem frustrados, tentam compensar suas incompetências corrompendo-os com presentes imerecidos convencidos pela frase "todo mundo na escola tem, só eu que não".
Certo dia entrevistei uma psicóloga que me contou ser muito comum que antes de suas palestras sobre relacionamento familiar ser procurada por pais que buscam uma resposta para uma antiga pergunta.
- Hoje mesmo uma mãe, dócil e educada me abordou perguntando "Doutora, diante de um mundo tão complexo, ensine-me como dizer não aos filhos". Eu respondi:
- Não! - Ene, a, til, o! Não! Basta isso.
Os pais toleram demais e a tolerância é a mãe de todas as mazelas. Ao chegarem à idade adulta enfrentarão sérios conflitos de relacionamento em todas as áreas... por não aceitarem um não.
O art. 39 do Código de Defesa do Consumidor (CDC) inciso I deste artigo, afirmando que: “é a prática comercial em que o fornecedor condiciona a venda de um produto ou serviço, à aquisição de outro produto ou serviço”.
Um povo que precisa de lei para permitir que idosos ou grávidas tenham preferência numa fila ou que impeça venda casada de hambúrguer e brinquedo está deixando para o Estado decidir o que é responsabilidade dele. Breve o Estado exigirá seu passaporte de vacina pra ir e vir, escolherá sua futura esposa, decidirá se restaurante coloque saleiro na mesa, o que você almoçará...