terça-feira, 22 de outubro de 2019

Educação: governos ignoram evidências científicas


Por Edson Joel Hirano Kamakura de Souza

- O que falta para melhorar a educação em nosso país? - perguntei para um empresário mariliense com a curiosidade de descobrir qual era seu nível de conhecimento nessa área. Imaginei que poderia até aceitar desconhecimento sobre o tema mas que jamais respondesse algo do tipo "falta investimento", assim buscando um culpado por tantos erros na educação, sem especificar quanto, onde e porque.

- Faltam investimentos! - proclamou ele, para minha decepção. E passou a discorrer o óbvio quando alguém ignora os números que apontam para o caos.

Explico: há retração na demanda de matrículas e por professores e a atual estrutura escolar é mais que suficiente. É preciso mudar o método de alfabetização e todos os números mostram isso. Aliás, não existe guerra para se escolher método de alfabetização. Existem números que apontam que o caos está no primeiro ano do ensino básico: o método de alfabetização utilizado no Brasil não alfabetiza.

Identicamente as matérias jornalísticas sobre educação produzidas por BBC Brasil, Rede Globo, e mesmo por revistas "especializadas" mostram a profunda falta de conhecimento sobre o tema. Por exemplo, para justificar os excelentes resultados das escolas municipais de Brejo Santo (cidade cearense de 48 mil habitantes, IDH baixo, renda per capita 70% menor que a média nacional) o repórter global ressalvou a merenda acompanhada por nutricionista, transporte de alunos e atualização dos professores mas, em nenhum momento citou que a explosiva mudança na qualidade do ensino tenha ocorrido por conta do método e metodologias de alfabetização, baseados no fônico. Lá, alunos do 5º ano tem 100% de aproveitamento em matemática, índice que escolas construtivistas estão distantes de alcançar. Em outras cidades cearenses escolas atingem índice 9 do Saeb de proficiência em matemática (escala de um a 9) impensável para Campinas e São Paulo, por exemplo. Das 100 melhores notas do Ideb em 2017, mais de 80 são de escolas que usam método fônico.

Evidências: escolas de Granja, uma pobre cidade do Ceará, tem índices de 9,3 no IDEB e proficiência de matemática de 9 na escala Saeb (que vai de zero a 9). Todas as escolas do Vale da Rapadura (região do Ceará com 12 cidades que adotaram o método fônico) tem IDEBd melhor que qualquer escola paulista (exceto as que adotaram o método fônico, também).

Em artigo recente assinado por João Batista Oliveira, o especialista em alfabetização disse que "os governos e empresários continuam torrando milhões – e mesmo bilhões de reais – em iniciativas inócuas" ignorando todas as evidências cientificas que mostram um caminho oposto ao trilhado ate agora.

João Batista Oliveira explica que "no campo da pesquisa educacional existem duas áreas exaustivamente pesquisadas em todo o mundo, com estudos rigorosos e resultados robustos. Uma delas diz respeito à leitura interativa para crianças desde o berço. A outra, à eficácia dos métodos de alfabetização de base fônica."

Enquanto isso o governo paulista de João Dória anunciou a ampliação das chamadas Escolas de Tempo Integral ignorando pesquisas sérias que mostram que os resultados são irrelevantes na correlação "mais horas na sala de aula X notas dos alunos."

Redes estaduais de educação são melhores do que as redes municipais?

Não há uma tendência consistente de melhoria nas redes estaduais ou municipais. O que há são bons exemplos isolados de alguns poucos estados e municípios.
Desempenho de redes municipais e estaduais é muito semelhante, e essa semelhança não se alterou ao longo dos últimos anos. (Camila Domingues, Palácio Piratini/Divulgação)

Por João Batista Oliveira  |  21 out 2019, 12h52

No 12º post da série baseada no Estudo “Para desatar os nós da educação – uma nova agenda”, tratamos de procurar saber se as redes estaduais são melhores do que as redes municipais. Para isso, é preciso que a maioria dos alunos das redes estaduais, na maioria dos municípios de um mesmo Estado, tenham melhor desempenho do que os alunos das redes municipais. 

Dado o que sabemos sobre a influência de fatores externos sobre o desempenho dos alunos e dado que o ambiente da cidade afetaria a todos de forma semelhante, somente uma rede estadual com uma seleção de alunos (ou uma gestão pedagógica muito eficaz) seria capaz de provocar tais resultados 

Há muita especulação a respeito. Por exemplo, as redes estaduais seriam mais organizadas, mais bem equipadas, possuem estruturas regionais – e, portanto, seriam mais capazes de prover bons serviços educacionais do que os municípios, especialmente os muito pequenos ou isolados. 

Outro argumento frequentemente levantado é o de que as redes estaduais conseguem atrair professores melhores – municípios muitas vezes não possuem critérios rigorosos de seleção ou não oferecem condições adequadas para os professores de sua rede. Também se especula que as redes estaduais possuem maior estabilidade – as equipes são mais permanentes tanto na sede quanto nas regionais. Enfim, são teorias, e que podem ser submetidas a testes. Fatos? Ou Mitos?

Eis o que dizem os dados. O gráfico abaixo apresenta o resultado agregado do conjunto das redes estaduais e das redes municipais. No conjunto, o desempenho é muito semelhante, e essa semelhança não se alterou ao longo do período estudado (2005 a 2017). Fizemos o mesmo estudo para as séries finais, e os resultados foram os mesmos.


Os dados estão aí, não dá para brigar com eles. Mas cabem interpretações. Uma delas é que as redes essencialmente seguem orientações semelhantes – seja por indução das redes estaduais, do MEC ou pela inércia. A outra seria que intervenções propostas pelas redes estaduais, mesmo onde são mais rigorosas, não seriam adequadas ou suficientes para surtir efeito. Uma terceira explicação seria a rotatividade de governos – pode até haver boas iniciativas, mas dificilmente elas resistem a mudanças de governo. 

O fato revelado pelos dados é que – quaisquer que sejam as causas – não há uma tendência consistente e sustentada de melhoria nas redes estaduais ou municipais. O que há, sempre, são casos individuais de estados e municípios – e, dentre esses, poucos se sustentam ao longo de vários anos.