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domingo, 2 de março de 2014

Mensalão: o crime bem organizado

Por Miriam Leitão

Todas as tardes foram tristes. Horas e horas vendo o dissecar de um crime pelo qual conspiraram publicitários, banqueiros e, principalmente, poderosos de um partido político que fez da “ética na política” seu lema inaugural.

Não era com alegria que o país via os longos votos nos quais, através da linguagem árida do mundo jurídico, a verdade desenhava um quadro desalentador.

Se alegria houve foi constatar a inédita mudança. Nunca antes na história deste país, poderosos de um partido, ainda no governo, foram condenados por ministros do Supremo indicados por aquele mesmo grupo político. Era o sonho, enfim, da quebra da cadeia da impunidade e de uma Justiça igualitária e impessoal. Era o aperfeiçoamento da democracia que pressupõe independência dos poderes.

Não foi prazeroso acompanhar as explicações da engenharia financeira tortuosa do crime instalado no coração da República, em que bancos concederam empréstimos forjados, um publicitário exibiu conexões impróprias, entidades públicas tomaram partido, o marqueteiro do presidente confessou que foi pago de forma nebulosa, o tesoureiro admitiu caixa dois e muito dinheiro foi distribuído a políticos da base governista, perto de votações. Nas minúcias, detalhes, contradições, e, principalmente, no concurso de muitos coautores, o país viu expostas operações de uma rede na qual o grande perdedor era o interesse público.

Foram tardes tristes, estafantes, mas não perdidas. O Brasil avançou, os acusados passaram a réus, de réus a condenados, de condenados a presos. O difícil está sendo entender a última das tardes. Haverá outras, mas essa foi definidora. Novos ministros, escolhidos majoritariamente no fim do processo, reformaram sentença já dada e tornaram toda a peça um conjunto desconjuntado.

Os autores do crime estavam juntos, juntos buscaram o mesmo objetivo, escolheram métodos ilegais, usaram o Estado como sesmaria, atuaram de forma coerente. Mas não formaram uma quadrilha. O que seriam eles? Um conjunto de rock? Uma facção? Uma falange? Um avião?

E quem foi o super-homem? O capo? Quem tinha maior poder que os outros de ferir os interesses coletivos? Quem estava com o primeiro ministério nas mãos ou quem mantinha com ele uma relação próxima? Na última das tardes, entendemos que mais forte é um publicitário que um chefe da Casa Civil. Os operadores cumprirão penas muito maiores do que os políticos. Com a ajuda da estranha matemática do processo penal no Brasil — em que um sexto é sempre igual ao todo — em breve tudo estará encerrado para os autores políticos. Os operadores permanecerão cumprindo a pena.

Os argumentos usados pelos integrantes da ala nova do Supremo não convenceram porque ferem a lógica dos eventos, a alma da sentença. E ao reformarem o que já estava estabelecido tiraram uma parte do fundamento do edifício. Ele balança sobre um vazio.

Há erros cometidos em outros partidos. Há um novo processo chegando ao Supremo, e espera-se que o plenário o julgue, para que não haja dois pesos e duas medidas para diferentes agremiações. E tudo o que a Nação espera é rigor no julgamento que aguarda na fila, até por ser um esquema parecido, exceto pela falta de distribuição de dinheiro para a base partidária.

Contudo, o Brasil avançou naquelas tardes. Não poderá dizer, o político-réu do novo processo, que foi apenas caixa dois e só para cobrir gastos de campanha ao governo. Os advogados que nos poupem de repisar as mesmas surradas desculpas de crimes aceitáveis. Isso permanece intacto: caixa dois é corrupção.

Ficarão votos fortes, jurisprudência, textos que serão usados em outros momentos em que a pátria for de novo acossada por — não quadrilhas, elas são abstrações — mas pelo concurso de delinquentes.

Duas rachaduras na parede do edifício poderão virar brechas pelas quais escapem os futuros membros de concursos. Primeiro, o temor de que governantes só escolham ministros com a promessa prévia de condescendência com os erros dos seus. Isso faria um STF com bancadas partidárias. Segundo, a confirmação da distopia de George Orwell na “Revolução dos Bichos”. Alguns são mais iguais que os outros.

O momento é de revisitar as enfadonhas tardes desse julgamento em que o Supremo fez história para lembrar, reforçar e confirmar cada etapa do avanço institucional dolorosamente conquistado.

quinta-feira, 29 de agosto de 2013

O Brasil tem o primeiro deputado presidiário da história


Deputado condenado pelo STF não perde mandato na Câmara Federal

Natan Donadon, atualmente sem partido, condenado pelo STF por peculato e formação de quadrilha a 13 anos e 4 meses de prisão, não foi cassado pelos seus pares da casa. Donadon, o deputado presidiário, absurdamente, mantém seu mandato. Foram 233 votos pela cassação e 131 contra, além de 41 abstenções. Seriam necessários 257 votos para a perda do mandato. Cerca de 108 deputados não compareceram a votação.

O vexame praticado pela Câmara Federal consolida a opinião de que aquela casa nunca foi e continua não sendo séria, ocupada por despreparados e usurpadores preocupados na prática de imoralidades políticas e corrupção. Não são homens de coragem e ética, são fantoches dos seus próprios e inconfessáveis interesses desonestos.

Diante do anúncio de absolvição de Donadon, o presidente do circo federal, Henrique Eduardo Alves, que é do PMDB-RN, anunciou o afastamento do presidiário e convocou o suplente, Amir Lando, também do PMDB-RO. O presidiário, que cumpre pena na Penitenciária da Papuda desde 28 de julho, continua deputado, embora sem salários e outros benefícios. Ontem ele foi autorizado a comparecer na câmara dos deputados - chegou algemado e escondido da imprensa - e, depois de agradecer ajoelhado, saiu de camburão para a cadeia.

A vergonhosa decisão do circo federal abre caminho para que deputados condenados no mensalão - José Genoino (PT-SP), João Paulo Cunha (PT-SP), Pedro Henry (PP-MT) e Valdemar Costa Neto (PR-SP) - riam na cara da justiça. E do povo.

Isso é um vexame e envergonha o país. É preciso mais que passeatas. É preciso uma rebelião.