sexta-feira, 11 de novembro de 2016

Freud, além da alma: uma experiência divertida.

Por Edson Joel Hirano Kamakura de Souza

Minha primeira tentativa de conhecer a mente humana foi aos 11 anos de idade quando tentei ler "Freud além da alma". Risos à parte, aprendi pouco e acabei levado para Araçatuba, pelo meu pai, pra conversar com um psiquiatra. Oras, o livro estava na prateleira do armário e eu, com algum tempo e coragem para me aventurar na sua leitura. Deu ruim.

O filme Freud além da alma foi lançado em 1962, mostra a trajetória de Sigmund Freud no estudo da histeria por meio da hipnose e acaba criando o método da psicanálise. Complexo de Édipo, Teoria dos Sonhos, as fases do desenvolvimento sexual... temas que retomei em leituras resumidas, mais tarde.

A consulta começou com questionamentos comportamentais, idade, escola, atividades extra curriculares, valores, sonhos... e vozes.

- Você ouve vozes? - perguntou-me o psiquiatra. Naquela época ainda não "existiam" psicólogos. O cara avançou rápido para tentar um diagnóstico.
 
- Sim! - respondi. Percebi na expressão do rosto que ele se sentia seguro no controle da entrevista.
- Que tipo de vozes? - continuou ele.

Fiz uma pausa dramática, olhei para o lado, pensei e respondi:
- Ouvir vozes são alucinações auditivas, delírios típicos da esquizofrenia. O senhor está me analisando por essa hipótese? Na verdade a única voz que ouço, de vez em quando, é do meu pai muito bravo quando faço bagunça - respondi rindo e olhando curioso a cara de espanto do doutor das mentes. Na medida que falava percebia que ele se afundava na cadeira. Assustado.

- Moleque, quantos anos você disse que tem?
- Onze.
- Onde você leu isso?
- Num livro chamado Freud além da alma.

O médico acertou o foco do olhar em meu rosto, fez alguns segundos de silêncio e quis ter certeza do que ouvira: 

-   Você está lendo o quê? - perguntou com aquela cara de surpresa e estranheza, silabando a frase. Freud além da alma? - reperguntou pra ter certeza. Quem te deu isso pra ler?
- Peguei na estante de casa, do meu irmão que se formou professor - expliquei ao atônico psiquiatra.

O cara, de uns 50 anos, recompôs-se na cadeira e permaneceu me olhando de braços cruzados. Analisando, na verdade. Então ele deu um leve sorriso em resposta ao meu concordando que a consulta de 10 minutos tinha encerrado.

Enquanto dirigia, no retorno para casa, meu pai colocou a mão na minha cabeça e disse, orgulhoso:

- O doutor fez um elogio e deu um conselho. Que você não tem nada e é muito inteligente.
- E qual foi o conselho? - quis saber.
- Pra eu sumir com aquele livro e só te entregar quando tiver 18 anos - falou, se divertindo.

No verão seguinte voltei ao Freud, seus Ids, egos e superegos.