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quarta-feira, 10 de setembro de 2014

O escândalo da Petrobras

Escândalo na Petrobras: a presidente disse
que "não sabia".
Palpos de aranha

Por Merval Pereira, O Globo

As duas candidatas que disputam a liderança da corrida presidencial estão em palpos de aranha com os problemas internos de suas campanhas. Marina não tem como explicar a contabilidade do PSB anterior à sua assunção como candidata, mas também não pode lavar as mãos como se nada tivesse com isso. O avião fantasma que não tem dono e a contabilidade paralela da usina Abreu e Lima em Pernambuco, pela qual o falecido ex-governador Eduardo Campos está incluído na lista dos beneficiários do esquema de corrupção da Petrobras, são temas delicados que ela tenta driblar com alguns constrangimentos óbvios.

Também a presidente Dilma é obrigada a dizer que nunca notou nada de anormal nas contas da Petrobras, passando recibo de má gestora, sem poder assumir as ações que tomou para tentar estancar a sangria na estatal. Ela garantiu recentemente que “as sangrias foram contidas”, embora oficialmente não saiba de nada.

A disputa entre o grupo da presidente Graça Foster, nomeada por Dilma para justamente tentar controlar o esquema que dominava a Petrobras, e o do ex-presidente José Gabrielli, responsável pela atuação do ex-diretor Paulo Roberto Costa, é conhecida de todos, mas Dilma não pode admitir que seu padrinho Lula, que chamava de Paulinho o ex-diretor hoje preso, dava apoio político ao velho esquema da Petrobras. Paulinho disse ao juiz Sérgio Moro que teve várias conversas com Lula.

Das duas, porém, Dilma tem culpa formal pela demora das providências, apesar dos constrangimentos partidários que a tolhiam.

Ficou com Paulo Roberto Costa como diretor da Petrobras durante um bom tempo, e só protestou contra a compra da refinaria de Pasadena nos EUA depois de anos da negociata feita, tendo inclusive preservado o diretor responsável, Nestor Cerveró. Marina não tem nada a ver com eventuais malfeitos anteriores à sua chegada no PSB.

O 2º turno mais longo dos últimos anos, como definiu o ex-presidente Lula, já está em curso, com a disputa polarizada entre Dilma e Marina, e as novas pesquisas que estão saindo confirmam uma reação da presidente, ao mesmo tempo em que Marina se mantém competitiva, apesar do bombardeio a que está sendo submetida.

A agressão verbal de que foi vítima ontem, com Dilma insinuando que Marina é sustentada por banqueiros, numa referência a Neca Setúbal, herdeira do Itaú, é exemplo dessa estratégia petista, confirmando que Dilma é capaz de “fazer o diabo” para se reeleger.

Não se sabe a essa altura como o 2º turno se desenrolará, mas Marina mantém uma vantagem numérica que tende a se reduzir à medida que a saraivada de golpes, alguns abaixo da linha da cintura, sucede-se.

Tudo indica que será uma disputa acirrada, com Dilma mobilizando toda a máquina partidária, e a máquina do governo também, para combater Marina, a adversária presumida no 2º turno.

Sua campanha já descartou a possibilidade de Aécio Neves do PSDB recuperar sua posição na corrida presidencial, e tudo que não querem é que ele apoie Marina ainda no 1º turno. Temem que essa ação possa criar um ambiente favorável ao voto útil em Marina, levando-a a uma vitória já no primeiro turno.

Não parece ser um movimento estratégico inteligente por parte de Aécio, que tem atrás de si um partido que pode ganhar diversos governos estaduais e precisa fazer uma bancada no Congresso que o coloque no jogo partidário.

Além do mais, o senador Aécio precisa necessariamente vencer a eleição para o governo de Minas, elegendo seu candidato Pimenta da Veiga, e passando à frente de Dilma e Marina na disputa presidencial.

A campanha de Dilma pretende, com o ataque a Marina sendo a sua tônica, debilitar a adversária para que chegue ao 2º turno enfraquecida. Em parte estão tendo sucesso, pois Marina, atacada sem dó nem piedade tanto por Dilma quanto por Aécio, parou de crescer.

Para Marina, o que importa é chegar ao 2º turno, para reagrupar suas forças numa nova campanha que a colocará em igualdade de condições na propaganda eleitoral com Dilma. Se o voto útil ainda lhe der fôlego de sobra para aumentar sua votação no primeiro turno, tirando votos do candidato Aécio Neves, melhor ainda.

O PSDB ainda mantém esperanças de alterar o quadro, que parece cristalizado, com as revelações dos escândalos da Petrobras e a situação da economia, que a cada dia se deteriora mais, a ponto de a agência de classificação Moodys ter sinalizado com a redução da nota brasileira. Não é um tema de apelo popular, mas demonstra que a economia brasileira não vai bem.

(Da coluna do Noblat)

terça-feira, 29 de julho de 2014

O Estado e o capitalismo

Dilma Rousseff: terrorismo explícito contra o mercado financeiro

Merval Pereira, O Globo / Da coluna do Noblat

Concordo com a presidente Dilma, que classificou ontem o que está acontecendo no mercado financeiro de “inadmissível” e “lamentável”, mas tenho a visão oposta à dela: o que é inaceitável é um governo, qualquer governo, interferir em uma empresa privada impedindo que ela expresse sua opinião sobre a situação econômica do país. Sobretudo uma instituição financeira, que tem a obrigação de orientar clientes para que invistam seu dinheiro da maneira mais rentável ou segura possível.

Numa democracia capitalista como a nossa, que ainda não é um “capitalismo de Estado” como o chinês — embora muitos dos que estão no governo sonhem com esse dia —, acusar um banco ou uma financeira de “terrorismo eleitoral”, por fazerem uma ligação óbvia entre a reeleição da presidente Dilma e dificuldades na economia, é, isso sim, exercer uma pressão indevida sobre instituições privadas.

Daqui a pouco vão impedir o Banco Central de divulgar a pesquisa Focus, que reúne os grandes bancos na previsão de crescimento da economia, pois a cada dia a média das análises indica sua redução, agora abaixo de 1% este ano.

Outro dia, escrevi uma coluna sobre a influência da economia nos resultados eleitorais, e o incômodo que a alta cúpula petista sentia ao ver análises sobre a correspondência entre os resultados das pesquisas eleitorais e os movimentos da Bolsa de Valores: quando Dilma cai, a Bolsa sobe.

Essa constatação, fácil de fazer e presente em todo o noticiário político do país nos últimos dias, ganhou ares de conspiração contra a candidatura governista e gerou intervenções de maneiras variadas do setor público no privado.

O Banco Santander foi forçado a pedir desculpas pela análise enviada a investidores sugerindo que prestassem atenção às pesquisas eleitorais, pois, se a presidente Dilma estancasse a queda de sua popularidade ou a recuperasse, os efeitos imediatos seriam a queda da Bolsa e a desvalorização cambial. E vice-versa.

O presidente do PT, Rui Falcão, já havia demonstrado que o partido governista não se contenta com um pedido de desculpas formal, como classificou a presidente Dilma: “A informação que deram é que estão demitindo todo o setor que foi responsável pela produção do texto. Inclusive gente de cima. E estão procurando uma maneira de resgatar o que fizeram”.

Ontem, na sabatina do UOL, a presidente Dilma disse, em tom ameaçador, que terá “uma conversa” com o CEO do Banco Santander.

Mas não foi apenas o Banco Santander que sofreu esse assédio moral por parte do governo. Também a consultoria de investimentos Empiricus Research foi acusada pelo PT de campanha eleitoral em favor do candidato oposicionista Aécio Neves, tendo o Tribunal Superior Eleitoral (TSE) acatado o pedido para que fossem retirados do Google Ads anúncios bem-humorados do tipo “Como se proteger de Dilma” e “E se Aécio ganhar”.

Justamente é este o ponto. A cada demonstração de autoritarismo e intervencionismo governamental, mais o mercado financeiro rejeita uma reeleição da presidente Dilma, prepara-se para enfrentá-la ou comemora a possibilidade de que não se realize.

Isso acontece simplesmente porque o mercado é essencialmente um instrumento da democracia, como transmissor de informações e expressão da opinião pública.

Atitudes como as que vêm se sucedendo, na tentativa de controlar o pensamento e a ação de investidores, só reforçam a ideia de que este é um governo que não tem a cultura da iniciativa privada, e não lida bem com pensamentos divergentes, vendo em qualquer crítica ou mesmo análise uma conspiração de inimigos que devem ser derrotados.

Um dos sócios da consultoria Empiricus Research, Felipe Miranda, afirmou em entrevistas que não se intimidará, e fez uma constatação óbvia. “O que já vínhamos falando aos nossos clientes sobre a gestão do governo e a condução da política econômica só piorou com esse cerceamento”.

quinta-feira, 26 de junho de 2014

Nem vítimas nem algozes


Merval Pereira, O Globo

A começar pela manutenção da negativa de prisão domiciliar para o ex-presidente do PT José Genoino, o plenário do STF analisou as decisões de Barbosa referentes à execução das penas do processo do mensalão dando-lhe razão em alguns casos e discordando em outros, sempre ressaltando, por praticamente todos os membros, que a lei de execuções penais compreende diversas interpretações, não sendo nenhuma das decisões de Joaquim Barbosa questionável por ilegal ou despropositada.

Não há no caso nem vítimas nem algozes, como ressaltou o decano do Supremo, o ministro Celso de Mello, que fez questão de ressaltar a justeza das condenações e o caráter antidemocrático dos atos praticados pelos réus do mensalão.

O caso de Genoino se transformou em emblemática questão política, já que petistas utilizaram todos os meios para espalhar a ideia de que o ex-presidente do PT, contra o que dizem diversos laudos médicos, corre risco de vida se não for liberada sua prisão domiciliar.

O ministro Luís Roberto Barroso, que assumiu a relatoria das execuções penais com a demissão de Barbosa, desde o primeiro momento que participou do julgamento do mensalão parece constrangido em condenar Genoino, e ontem voltou a elogiá-lo. No primeiro momento, lamentou “condenar um homem que participou da resistência à ditadura no Brasil, em um tempo em que isso exigia abnegação e envolvia muitos riscos”.

Esse discurso elogioso provocou a reação de diversos ministros na ocasião. A ministra Cármen Lúcia disse que “o juiz, infelizmente, não julga histórias, porque as histórias às vezes são feitas de desvios que seriam impensáveis de serem praticados em outra circunstância”.

Ontem, Barroso classificou Genoino de “símbolo do republicanismo e do igualitarismo” antes de negar o pedido para que a prisão fosse transformada em domiciliar. Mas, sem que a questão estivesse em pauta, lembrou que Genoino cumpre 1/6 da pena em dois meses, dando a entender que a partir daí poderá ir para casa.

A questão do cumprimento de 1/6 das penas para a autorização de trabalho externo suscitou uma boa discussão sobre o sistema penitenciário e demonstrou que Barbosa não estava exagerando ao interpretar ao pé da letra a exigência do Código Penal.

Celso de Mello foi o único voto a apoiar Barbosa, mas não é o único a considerar que a jurisprudência do STF deve prevalecer sobre a do STJ, que desde 1999 vem admitindo o trabalho externo sem o cumprimento mínimo da pena. Mesmo os que votaram contra a posição de Barbosa, a começar pelo relator Barroso, admitiram que a situação do sistema penitenciário é um descalabro, e que a flexibilização da lei é necessária para conviver com nossa triste realidade.

A tese vencedora foi que a razoabilidade exige interpretação mais generosa da legislação, sendo lembrado que o Rio Grande do Sul já definiu que os presos em semiaberto devem ir para prisão domiciliar por falta de vagas compatíveis com o tipo de condenação. Esse assunto será levado ao plenário do STF pelo ministro Gilmar Mendes para que haja deliberação sobre essa decisão da justiça gaúcha.

Ficou claro que o estilo centralizador e autoritário do presidente demissionário Joaquim Barbosa não é o da preferência do plenário, tanto que a execução das penas será transferida para Vara de Execuções Penais de Brasília, e não centralizada pelo novo relator.

Mas ficou evidenciado que Barbosa não abusou de seu poder nem tomou decisões sem o apoio da lei. E certamente há um pensamento majoritário na sociedade, já detectado por pesquisas: o mensalão petista só levou poderosos para a cadeia e os manteve lá pelo estilo centralizador e autoritário de Barbosa, amplamente aprovado pela população, a ponto de uma parcela representativa querê-lo como candidato à Presidência.

terça-feira, 4 de fevereiro de 2014

Rumo a 2018?

Merval Pereira, O Globo

Ficar pelo menos 20 anos no poder tem sido o sonho de consumo dos partidos políticos brasileiros desde que PC Farias prognosticou que o governo Collor iniciaria uma saga dessa duração. Depois foi Serjão, o trator do PSDB, quem definiu que em 20 anos os tucanos transformariam a face do país, e fez-se a reeleição.

Hoje, o PT está mais próximo do que jamais estiveram os outros partidos de cumprir essa sina, e não é à toa que já se anuncia que Lula estaria disposto a voltar a se candidatar em 2018, dando como favas contadas a reeleição da presidente Dilma este ano.

De todos os partidos que estiveram em proeminência na política brasileira depois da redemocratização, o PT é sem dúvida o que montou a máquina política mais eficiente do ponto de vista eleitoral, não de gestão pública, e vem trabalhando com competência para atingir seu objetivo, sem que entre nesse julgamento qualquer valor ético ou moral.

Caberá à presidente Dilma, por esses azares que só a política sabe montar, a consolidação do projeto petista, logo ela que não é uma petista de raiz e não conseguiu capturar a alma dos petistas.

Caso se reeleja, como indicam as pesquisas, e o PT vença os governos estaduais em São Paulo e no Rio de Janeiro, por exemplo, estará aplainado o caminho para a afirmação da hegemonia petista por 20 anos ou mais.

Mais paradoxal ainda, Dilma poderá ser, por outro lado, a culpada pela interrupção da escalada no poder do PT, pois tem feito até o momento um governo mais que medíocre que abre às oposições, ampliadas pela defecção à esquerda do PSB de Eduardo Campos, a melhor chance dos últimos tempos de vencer as eleições de outubro.

De fato, embora Dilma continue sendo a favorita, nunca houve melhores condições objetivas e subjetivas de derrotar o PT, e certamente é por isso que tantas trapalhadas administrativas vêm acontecendo, transformando situações corriqueiras, como a necessidade de escalas técnicas em viagens internacionais, em crises políticas que a oposição vem explorando com o mesmo grau de intransigência que caracterizou a atuação petista na oposição.

As condições subjetivas estão nas ruas desde junho do ano passado, surpreendendo quem se considerava dono das manifestações populares. As coisas estão muito tumultuadas no país hoje, com a incerteza tomando conta da percepção popular quer com relação à situação econômica, quer quanto à de segurança pública, e ambientes incertos quanto ao futuro não fazem bem aos governos.

Dizer que a oposição é tão fraca que não oferece perigo à hegemonia petista é simples jogo político, pois a situação não é tão fácil quanto querem que pareça. A oposição, não importa que candidato apresente, tem recebido sistematicamente entre 40% e 45% dos votos no segundo turno, isso porque o PT, apesar de toda a força popular de Lula, nunca conseguiu vencer uma eleição presidencial no primeiro turno, e, no entanto, Lula foi derrotado nessas circunstâncias por Fernando Henrique duas vezes seguidas.

Mesmo o fato de terem vencido três eleições seguidas não dá ao PT a hegemonia que ostenta, pois bastaria uma derrota para o PSDB este ano para que a igualdade se estabelecesse.

O fato é que o país continua virtualmente dividido entre as forças políticas que apoiam PT e PSDB, sendo que o lado petista tem uma superioridade artificial neste momento, depois que perdeu o apoio do grupo ecológico liderado pela senadora Marina Silva, e agora uma dissidência socialista consolida a ruptura de forças políticas ponderáveis à esquerda, deixando o PT nas mãos de partidos de centro ou de direita como o PMDB, o PP, o PSD.

Uma aliança frágil que pode se romper a qualquer momento, como está acontecendo em alguns estados, como a Bahia e o Rio de Janeiro. Independentemente de ações acertadas da oposição, há problemas para o governo em todos os estados em que teve grande votação na eleição de 2010, até mesmo no Maranhão.

A presidente Dilma é temida, mas não amada por seus aliados não ideológicos. E o PT nem é temido nem amado. Todos prefeririam ganhar com Aécio Neves ou Eduardo Campos do que com ela ou o PT.

sábado, 16 de novembro de 2013

Símbolos


15 de novembro de 1889, Praça da Aclamação, atual Praça da República (Rio de Janeiro: Marechal Manuel Deodoro da Fonseca proclama a República, destituindo D. Pedro II

Merval Pereira, O Globo

No decorrer do processo, petistas tentaram impedir que a mídia se referisse ao caso como “mensalão”, mas o máximo que conseguiram foi que o noticiário oficial, tanto do governo quanto do Supremo Tribunal Federal, passasse a se referir ao caso como a Ação Penal 470.

Agora, ao serem expedidas as primeiras ordens de prisão, atribui-se ao ministro Joaquim Barbosa a intenção de marcar a comemoração da Proclamação da República com as prisões de José Dirceu e companhia. Seria nada além de uma jogada de marketing de Barbosa, já se preparando, quem sabe, para uma futura carreira política.

Mesmo que a intenção tenha sido a de marcar a “refundação” da República brasileira, nada a criticar no presidente do Supremo Tribunal Federal, pois nenhum trâmite legal foi atropelado para que a coincidência se desse.

O criticável será se, nos próximos meses, o relator do mensalão sair do Supremo para se candidatar, pois, como todos os magistrados, ele tem um prazo mais largo para se filiar a um partido político.

Será inevitável que todos os seus passos como relator do mensalão, e mesmo suas indignações cívicas, sejam confundidos com ações políticas, o que nublaria suas decisões. Mais simbolismos a serem decifrados.

Quando Barbosa apareceu com nada de novo sobre o mensalão na quinta-feira, houve uma espécie de decepção, e logo críticas foram feitas a ele, que prometera divulgar a lista dos presos naquela sessão.

Houve até quem desconfiasse de que alguma coisa acontecia nos bastidores, mas o que realmente aconteceu é que Joaquim Barbosa trabalhou até de madrugada, e ontem, no feriado, para poder expedir as ordens de prisão sem cometer erros técnicos que as invalidassem.

Não ter expedido as ordens de prisão imediatamente após a sessão de quarta-feira foi, aliás, uma demonstração de que Barbosa e o STF que preside não estavam ávidos por uma vingança.

A própria presidente Dilma veio em socorro indireto a Barbosa na mensagem que enviou pelo Twitter para saudar a Proclamação da República. Ela afirmou que a origem da palavra República “nos ensina muito”, vem do latim e significa ‘coisa pública’.

Sendo assim, ser a presidente da República significa “zelar e proteger a ‘coisa pública’, cuidar do bem comum, prevenir e combater a corrupção”.

Nada mais adequado, portanto, para comemorar a República do que colocar na cadeia os condenados por tentar desmoralizar suas instituições, superdimensionando o poder do Executivo pela submissão do Legislativo através da compra de apoio político.

Nesta nossa República democrática, surge agora a figura dos “presos políticos”, sejam os componentes dos Black Blocs, sejam os mensaleiros que assim querem ser identificados.

Assim como não existe caixa dois com dinheiro público, como definiu o STF, não há presos políticos em uma democracia.

José Genoino provavelmente não reconhece a existência de presos políticos em Cuba, ou não manteria seu apoio ao regime ditatorial cubano. Mas se considera um “preso político” na democracia dirigida por seu partido há 11 anos.

Além de insistir na teoria da conspiração de que houve uma “operação midiática inédita na História do Brasil” para condená-lo, Genoino acusou ontem o julgamento do Supremo de ter sido “marcado por injustiças e desrespeito às regras do Estado democrático de Direito”.

Esse processo “de exceção” teria ocorrido num Supremo Tribunal Federal (STF) de um regime democrático, cuja maioria dos ministros foi nomeada pelo ex-presidente Lula e pela presidente Dilma, ambos do PT, partido que José Genoino presidia quando o mensalão aconteceu. Durma-se com um barulho desses.

terça-feira, 13 de agosto de 2013

Novos ministros do STF indicados por Dilma podem favorecer réus do mensalão

Os riscos do mensalão
Merval Pereira, O Globo

A mudança da pauta do recomeço do julgamento do mensalão tem a ver com a impossibilidade de o ministro Teori Zavascki estar presente à primeira sessão, amanhã, devido ao falecimento de sua mulher, mas atende também a uma preocupação do presidente do STF, Joaquim Barbosa, de ganhar tempo para colocar em votação a admissibilidade dos embargos infringentes. Há uma divisão no plenário quanto ao tema.

A definição do plenário será decisiva para o decorrer do julgamento, pois, se a maioria considerar que ainda são aceitáveis, dois itens serão julgados novamente: formação de quadrilha e lavagem de dinheiro.

A posição do presidente do STF é a de que os embargos infringentes deixaram de existir nas ações originárias dos Tribunais Superiores depois da lei 8.038/90, que regulamentou os processos naqueles tribunais segundo a Constituição de 1988, sem prevê-los.

Em artigo aqui mesmo no GLOBO, a ministra Ellen Gracie, ex-presidente do STF, escreveu que “nos termos do § 1º, do art. 2º, da Lei de Introdução às Normas do Direito Brasileiro: A lei posterior revoga a anterior (…) quando regule inteiramente a matéria de que tratava a lei anterior”.

O mais recente ministro indicado para o Supremo, Luís Roberto Barroso, disse na sabatina no Senado que, na “teoria”, o Regimento Interno do STF, que prevê os embargos infringentes, perdeu o status de lei com a Constituição de 1988, que “vedou essa competência normativa primária”, e o regimento passou a ter competência limitada.

A tendência de Gilmar Mendes, Marco Aurélio Mello e Luiz Fux é seguir esse entendimento. Também os ministros Teori Zavascki e Rosa Weber, que vieram do Superior Tribunal de Justiça, devem ter o mesmo entendimento, embora não o tenham revelado, pois o STJ, por ter sido criado depois da Constituição, não prevê os embargos infringentes em ações originárias.

Mas a posição do decano Celso de Mello tem peso, e ele já a antecipou no próprio julgamento do mensalão, registrada no acórdão: “Não obstante a superveniente edição da lei 8.038/90, ainda subsiste, com força de lei, a regra consubstanciada no artigo 333, parágrafo I, do Regimento Interno do STF, plenamente compatível com a nova ordem ritual estabelecida para os processos penais originários instaurados perante o STF”.

Celso de Mello considera que os embargos infringentes auxiliarão “a concretização, no âmbito do STF, do postulado do duplo reexame, que torna pleno o respeito ao direito consagrado”. A decisão ganhou importância depois que, no julgamento do senador Ivo Cassol, os novos ministros Teori Zavascki e Luís Roberto Barroso juntaram-se aos outros quatro ministros que, no julgamento do mensalão, consideraram que não houve formação de quadrilha.

Já escrevi aqui que, num sistema de Justiça equilibrado, com um esquema penitenciário sem distorções como aquelas que temos no Brasil, não haveria nenhum problema em que as penas do ex-ministro José Dirceu e de outros fossem reduzidas numa eventual revisão de julgamento sobre o crime de formação de quadrilha, ou lavagem de dinheiro, por exemplo.

De qualquer maneira, a condenação dos réus do mensalão já está dada. Só aceitar uma pena que o coloque em regime fechado, como a que está condenado, seria apenas uma vingança política. Mas a triste realidade brasileira é que a transformação da condenação em regime semiaberto significa na prática uma manobra para que o réu de colarinho branco acabe escapando da cadeia, pois não existem no país prisões albergues suficientes.

Os condenados a regime semiaberto acabam mesmo em prisão domiciliar, com todas as regalias inerentes. Outro temor é que o próprio Dirceu e outros réus se aproveitem de uma decisão de que não houve formação de quadrilha para alegar que o julgamento todo tem que ser revisto, pois a base da denúncia da Procuradoria Geral foi que Dirceu chefiou uma quadrilha de dentro do Palácio do Planalto.

Mesmo que corrupção ativa e formação de quadrilha sejam crimes autônomos, o nexo da acusação pode vir a ser contestado, no mínimo para ganhar tempo com novos recursos. Só não há, aparentemente, perigo de prescrição, pois, de acordo com o artigo 109 do Código Penal, a prescrição da pena, se superior a quatro anos e não excedente a oito, acontece em 12 anos. Mas, no Brasil, nunca se sabe...