Por Edson Joel Hirano Kamakura de Souza
José Carrancudo é um professor em Portugal e se confessa preocupado com os rumos da educação em seu país. Portugal adotou há mais de 30 anos o método de alfabetização construtivista e lá, tal cá, os jovens mal sabem ler um jornal ou concluir uma operação de matemática simples.
"Pra que formar cidadãos assim", pergunta Nuno Crato, o novo ministro da Educação e Ciências de Portugal faz dois anos e meio no cargo e com a missão de recuperar o tempo perdido. Ele rompeu com o radicalismo do método global e impôs novas regras: ao mesmo tempo que defende mais autonomia para as escolas, Nuno Crato não abre mão de um ensino rigoroso, lastreado em conteúdos curriculares (Português, Matemática, História, Geografia, Ciências e Inglês), metas, avaliações e mérito. Para o novo ministro o construtivismo - principalmente as vertentes imbecilizadas pelo radicalismo - dão uma noção vaga de "competências" que secundariza o conhecimento.
Agora os alunos portugueses terão avaliações e objetivos cognitivos bem definidos ao contrário do construtivismo que não permite jamais que o professor corrija o erro de um aluno para que ele não se sinta constrangido ou seja que seja avaliado. O artigo de Carrancudo, escrito em 2007, é uma proposta de educação para Portugal e que mostra porque métodos como o construtivismo não alfabetizam.
ENSINO ESCOLAR: METAS E MEDIDAS
Por José Carrancudo
O estado deplorável do sistema escolar nacional é do conhecimento público, e cada um consegue apresentar diversos exemplos ilustrativos deste fenómeno. Vários remédios foram propostos, uma grande parte dos quais, incluindo as recomendações das entidades europeias, cita a necessidade de transformar o ensino num conjunto de prestadores de serviços educativos, de modo que os alunos e os seus pais possam escolher aquele prestador que proporciona um serviço educativo melhor.
Todavia, todos estes remédios falham em vários pontos importantes, nomeadamente:
1. O principal objectivo do sistema escolar é de proporcionar ao aluno as ferramentas necessárias para a sua aprendizagem futura, tanto no ensino superior, como ao longo da sua vida, além de conhecimentos e competências concretas.
2. Um sistema escolar, correctamente construído, deve proporcionar uma formação adequada (equivalente a uma avaliação objectiva de “Bom”) a um aluno médio.
As principais ferramentas do nosso aluno são o Português, e a Matemática, sendo esta última a língua comum das ciências exactas e tecnologias. As notas médias dos exames nacionais destas duas disciplinas são de 7, o que mostra uma incapacidade do nosso sistema escolar de proporcionar as ferramentas essenciais ao aluno médio. Não devemos esquecer ainda que a nossa taxa de abandono escolar é de 40%, assim, o sistema escolar consegue ensinar, com uma grande ajuda dos explicadores, apenas 1/5 dos alunos que entram no primeiro ano da escolaridade.
Analisando objectivamente os currículos escolares, concluímos que estes são suficientes, do ponto de vista de conhecimentos e competências que o aluno deveria obter. O problema, então, não está no que estamos a ensinar, mas sim no como.
Olhando atentamente para o ensino escolar, detectamos duas falhas metódicas gravíssimas, que impossibilitam um desenvolvimento intelectual adequado de um aluno médio.
A primeira é a aposta no pensamento crítico dos alunos, em detrimento de memorização sistematizada de conhecimentos, e em detrimento do desenvolvimento de capacidade de memorização. Há 30 anos, apostamos na criação de um ensino mais democrático, baseado no desenvolvimento da capacidade de pensamento crítico e criativo, eliminando por isso os exercícios para desenvolvimento da memória dos currículos de todos os anos. Esta aposta falha em dois aspectos. Em primeiro lugar, um aluno típico da escola primária (primeiro ciclo) não tem capacidade de pensamento crítico, aceitando de bom grado tudo que lhe seja dito pelos adultos. Mesmo que este aluno aparente uma capacidade razoável de pensamento crítico, na realidade apenas interpreta as dicas do professor, dadas voluntária ou involuntariamente. Entretanto, o pensamento crítico do aluno pode e deve ser desenvolvido, mas gradualmente, e nos alunos já com idade mais avançada, e, consequentemente, com capacidades mentais mais desenvolvidas. Em segundo lugar, abstendo do desenvolvimento da capacidade de memorização sistematizada do aluno, a escola não aproveita deste recurso que o aluno já possui, e que deve ser desenvolvido, desde logo, para proporcionar as bases para o próprio pensamento crítico, pois não há lugar para qualquer pensamento sem recurso aos conhecimentos memorizados.
A segunda é a aposta no método global (visual) de ensino de leitura. Este método para sua implementação correcta necessita de professores excelentes e bem preparados, pois na consequência de erros comuns na sua implementação os alunos não aprendem a ler fluentemente em tempo útil, o que consideramos ser o segundo ano da escola primária (primeiro ciclo). As tentativas falhadas dos últimos 30 anos de usar este método mais que justificam a sua proibição oficial, pois na consequência do seu uso cerca de 80% dos nossos alunos não aprendem a leitura atempadamente, com consequências graves para todo o seu percurso escolar.
Assim, para começarmos a reconstruir a nossa escola, devemos eliminar, e o mais depressa possível, as falhas metódicas mencionadas, sendo certo que os exercícios de memorização sistematizada devem ser reintroduzidas em todas as disciplinas de todos os ciclos, e não apenas na escola primária. Devemos ainda prescindir das tentativas fúteis de usar o "pensamento crítico e independente" dos alunos do 1º e 2º Ciclos do Ensino Básico, cujo cérebro ainda não desenvolveu esta capacidade. Devemos admitir ainda que o processo de reconstrução vai ser demorado, pois as alterações introduzidas hoje não trarão grandes vantagens para os alunos que se encontram nos ciclos preparatórios e na escola secundária. Podemos tentar ensinar a estes alunos, mais uma vez, aquilo que não aprenderam quando deviam ter aprendido, embora sem grande esperança de sucesso.
Precisamos de corrigir, urgentemente, o paradigma do nosso ensino, fatalmente viciado por razões ideológicas.
José Carrancudo é professor em Portugal